sábado, 30 de maio de 2020

Eu e você
Dois lados de um mesmo país
Entre nós a rua, a calçada, as esquinas
Carros e semáforos acesos
Alguns quilômetros
Uma distância de horas
Eu e você
Dois lados da mesma cidade
Entre nós uma vontade de mais
Beijos, abraços, lençóis de cetim
Alguns quilômetros
Uma distância de minutos
Eu e você
Entre nós uma tela cristalina
Saudades, imagens, canções pelo vento
Alguns quilômetros
Uma distância de desejos.

sábado, 23 de maio de 2020

Tem muita coisa morta dentro de mim
Todas vivendo bem num movimento sólido
Rodopios severos acontecem em minha mente
Náuseas, enjoos, vestígios de uma alma
Mortal ou imortal, quem se importa afinal
Seres vermelhos, brancos, pretos, multifacetados
Todos são eu e ao mesmo tempo são ninguém
Tudo encarcerado num só vômito do agora
Então sou mais um verme dentro do estômago
Louco para soltar a angústia que aflige
Um mundo construído por uma ilusão divina
Que apodrece cada um em seu lado da margem
De que vale ser, se quando terminar nada será
A não ser pela vazia preocupação do porvir.

domingo, 17 de maio de 2020

O que é o amor, senão um esforço
De encontrar uma nota musical singular
No alto de uma montanha ao pôr do sol
Sob os olhares de pássaros cantores azuis.

Não, isso não é o amor em si
Não passa de uma desesperada ilusão
De alguém que se afoga diariamente
Em imagens adocicadas das novelas.

Amor é o jogar-se do penhasco profundo
E não ter medo da queda certeira
Ir de olhos abertos rumo ao chão rígido
Chegar lá embaixo e se despedaçar por completo.

Isso também não é o amor real
É somente uma imagem numa tela
Uma tentativa de sentir algo maior
Uma coisa intocável pelas nossas mãos vazias.

Amor na realidade nua e crua
É nada, é um talvez apertado
É aquilo que não podemos sentir
Mas é tudo pelo que podemos viver.

quarta-feira, 6 de maio de 2020

Pé na areia, sol, mar, brisa que há
Pé na areia, olhar o dia raiar
Pé na areia, vontade que sempre me dá
Pé na areia, saudades de Iemanjá

terça-feira, 5 de maio de 2020

O tempo me sugou do vórtex abissal
Agora me deito na beira pra não me afogar
Sou como qualquer outro sem barco
Sou só pêlos, carne, pau e bolor
Às vezes me coloco intangível à dor
Sobreviver também é necessário
A vida vai se dissolvendo em números
Me distancio dos sons agudos
Vou me virando nas cores da sombras
Tento todo dia chegar na linha final
Sem que duros espinhos me cortem a carne
Sem perder os dentes do cão.
Eu não quero deixar marcas no colchão
Quero minha pele debaixo de suas unhas
Sinal do nosso antigo amor de verão
De um tempo que não éramos mais amantes
Num salto nos perdemos em algum lugar
Não sei se num futuro ou passado
Mas num momento que deixamos de ser únicos
Voz, corpo, sexo e alma consumidos
Só ficou aquele sentimento do vazio
E um gosto de vinho não bebido.