domingo, 31 de janeiro de 2010


Sem título
Sem verso
Sem rima
Sem alma
Sem o eu
Dentro de você.

Hoje acordei com cheiro de nostalgia,
tomar vinho antigo,
banhar-me em águas mornas,
respirar o mofo,
ouvir os disco arranhados,
colar as fotos
reler as cartas,
e colocar as rosas murchas no vaso.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010


Minha alegria é pôr do sol,
nunca chega a tocar o chão.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010


Aos poucos meu brilho
torna-se acinzentado,
não sei se são os olhos deste
que se turvam
ou é só a falta da lua cheia.
Caminhar pelas pedras
é tarefa árdua,
meus pés são rachados,
mas sem calos.
Não desce pela garganta
o leite e o mel do coração,
pois com a voz muda,
não se vela mais.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010


Lua, lua, lua
Infeliz ideia tua
De fazer-te prata em ouro
a andar-te nua.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010


Hoje o que me toca
é a voz da morte,
que ecoa da infinitude
da galáxia para dentro
do meu peito,
raio de sol
e feitiço de luar.
Já não posso estar só
pois minha cama
não consegue andar só
e as lágrimas
inundam os mistérios
que inventam a paixão,
abrace-me, me toma febril,
me joga para o alto,
me escureça a face.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010


Como sorrir com o peito cheio de pedra.
Minhas gengivas de sangue turvo, sujam seus olhos.
Minha pele infecunda insiste em se manter inteira,
mas como fazer isso sem teu cheiro.
Me perdi quando cortei o cordão que prendia-me a ti.
Não ando mais, pois fui decepado de meus olhos.
Agora o que me resta é o que sobrou de uma lembrança marginal.

domingo, 24 de janeiro de 2010


Um contra-ponto
Quem é caça?
Quem é caçador?
Eu e você
Quem nos devorará
Ao final?

sábado, 23 de janeiro de 2010


Meus lábios desejosos
não se contentam com um beijo.
Minhas mãos lentamente
pedem mais de tua pele.
Meus olhos procuram
por seus olhos abertos.
Minha língua vasculha
teus suaves caminhos.
Meu corpo
necessita de teu peso.
Meus ouvidos tremem
diante tuas palavras.
Minha alma se ergue
na tua presença.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010


A chuva passou,
o vento pôs-se a secar
a solidão de outrora.
Eu decidi ficar
parado, perdido,
sem nenhum lugar para admirar.
Eu estava ali,
aberto, em branco,
mas ninguém via
o que eu queria mostrar.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010


Esqueci-me que no céu existem estrelas,
tampouco lembrava do seu brilho,
porém do negrume entre elas, as estrelas,
eu não conseguia esquecer.
Esqueci-me de outras cousas que não retornam mais,
contudo diante intenso brilho, sou forçado a recordar
e vem uma suave lembrança, devo retornar à minha infância.

Henrique
entre 2
Objetos
um
a rocha
o outro
afunda.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010


Dedos, dedos, dedos
cinco dedos na mão direita
um calo no pé esquerdo
um buraco no peito ardente
sombra e sangue na garganta
paletó fechado n’altura do pescoço
ida e volta, ida e volta, ida e volta
e o chapéu voou longe das minhas mãos
no rumo certo dos dentes cerrados
os olhos vermelhos de grande pesar
escondendo-se nas entrelinhas dos seus braços
dizem tudo o que não se pode dizer.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010


Sombras escuras
Obscuras
Obliteradas
Mola mestra
Gira o mundo
Come carne
Rompe ventre
Jorra sangue
Cria cuervos
Designa tons
Lança carvão
Lambe sal
Fecha porta
Abre olhos.

domingo, 17 de janeiro de 2010


Sinto o impulso dos teus lábios,
mas não vejo verdades,
tampouco brotam mentiras.
O que sai é uma cruel dúvida,
é a incerteza que caminha em tua garganta.
Uma voz calada, tímida se pronuncia,
mas a frase não titubeia,
corta o ar como machado
e instala cega em meus ouvidos,
me deixa em pedra e ar.
Só consigo suportar uma resposta
e vocifero-a em caixa alta:
- “EU TAMBÉM!”

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010


Não, não te espero mais
Em pé com minha paz
A suspirar meus ais
Na hemorragia do dia-a-dia
Em horas sombrias
Em sóis anis soltos no mar.
Vou-me embora
Suportar comigo mesmo
O indigesto da noite
A manhã sem amanhã
O triste solitário fim da madrugada.
Volto logo
Para um último bom-dia
Para ver recordações
Para ouvir o bater das asas
Para lembrar o que teria sido
Para suportar a minha ausência.

Tem de ficar por dentro
tem de ficar de fora
se for para ficar sofrendo
tem de ser agora
tem de falar com jeito
tem que falar na hora
é preciso saber tudo
é preciso ser agora .
Não se pode dizer que eu não tentei,
não se pode negar que eu chorei
só se pode dizer mais um adeus
só não sei se vale dizer adeus.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010


Tudo cabe em mim
pois tudo é muito pouco.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010


Deixa o sofrimento aos poetas
É da dor que eles se alimentam.
Quanto a mim,
Não quero a dor,
Tampouco o amor.
Só quero as incertezas do viver.
Sirvam-me os restos,
A desilusão da carne,
Os dejetos,
O limo e o lodo,
O vapor dos ácidos.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010


Por onde andam os olhos,
O que eles fazem ao abrir,
Será que observam o tempo passar
Ou somente deixam a luz entrar.
O que toca em sua pele
Será o sol de cada manhã,
Será o orvalho do teu próprio ser
Ou será somente o ar.
Qual o gosto que passa em sua boca
Será o doce sabor da vida
Ou o âmago do teu ser.
O que passa por seus ouvidos,
O rufar do teu coração,
A música do viver
Ou a paixão noturna.
O que entra por suas narinas,
O mel do amor,
O sangue do desejo
Ou a própria vida.
Deixe-me possuir teus sentidos,
Deixe-me vê-lo, toca-lo, saboreá-lo, ouvi-lo, respira-lo,
Para que eu possa amá-lo.

O sol é ouro
a lua é prata
desejo é o corpo
palavras são levadas ao vento
a fome do desejo me consome
abraço é o encontro de nossos corpos
beijo é o que abre minha alma
amor é o meu mundo explodindo em luz
o que escrevo são marcas na pele
meu sangue jorra em você
somos um, único ser
um quadro contínuo de uma tempestade em alto mar
um sonho freudiano em mente universal
um coração unilateral

domingo, 10 de janeiro de 2010


Observo o objeto
Observando a paisagem
Nada sorri
É pura miragem.
Roda a engrenagem
E amola a faca
Corta a corda
Cai a máquina.
Respira as cinzas
Pede passagem
Não adianta mais
Já se foi a paisagem.

Uma linha branca
pronta para ser transpassada
uma violação da alma
negra e pura
que se acessa
ainda febril
turbilhão às avessas
não cabe mais na linha
e alinha com o mundo
deselegantemente banal
ao qual não pertenço
ou pela falta de senso
ou de sentido
pois tanto faz se chove
ou se seca a carne ao sol
tanto faz
a sombra já não importa mais
tampouco o cheiro das frutas
e a música é jazz
a trilha se faz em blues
uma coisa da bossa’n’fossa
sem vento ou trovões
sem passarelas e marquises
somente guetos e buracos
que tentam sobreviver
à margem sem rio
sem mar, sem fim,
sem pássaros, sem ais de mim,
sem alma,
sem tudo, sem nada,
somente o só e eu
que não sabe o que sou
que estou
onde o estar não está
onde o branco e o preto
já não são cores
e o nada se confunde
com o tudo por igual
e nada mais é nada mais.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010


Tudo que eu poderia fazer foi feito
Nenhum abscesso aberto
Coladas todas as feridas
Papel e barbante sobre o sangue seco
Não há nenhum rasgo novo
Só meus pés sobre vidros

Flor cálida que se enraíza em meu peito
Alimenta-me com tuas folhas e sementes
Desabrocha-te em vermelho carmim
E pulveriza teus anseios em meus olhos febris.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010


Nenhuma palavra é dita,
meu corpo conversa com o seu,
meus olhos se apresentam,
sinta meu coração,
seja meus poros agora,
reflita sobre minha carne,
devora minhas veias com tuas mãos,
cala minha pulsação com teus dentes,
recobre meu corpo com tua saliva,
bebe do leite do meu sexo,
termine minhas palavras.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010


As coisas que meus olhos vêem
as coisas que meus olhos sentem
traduzem minh'alma.
O hoje difere-se do ontem
que se diferirá do amanhã.
As coisas mudam,
o mundo muda
em um piscar
lânguido e febril.
O ângulo de minha janela
altera-se com o nascer do sol
como altera-se o que há em mim,
o que há em nós.
O âmago do meu ser
está em constante movimentação,
num eterno piscar ligeiro,
delicadamente transmutador.
Mas o mundo também pisca
em uma velocidade maior,
assustadoramente quase impenetrável
e tangível.
É a admirável essência do infinito
que reflete-se em mim,
que se parte em mil,
me envolve,
me rasga a alma,
despedaça o meu ser,
para que dele renasça
a cada dia,
ora amargo,
ora gélido,
ora dominante,
ora suave,
ora solto,
ora eu,
ora nós,
ora mais eus que se possa contar.
Mas a janela não se fecha,
Ela gira sempre aberta.

Cantam os pássaros sobre os fios tencionados
Perigo constante assumido
Quero poder voar para o sul ao fim do dia.

Misture-se em mim
Sinta meu caos
Abrace minha dor
Saboreie meu sangue
Carregue meu corpo
Seja o meu inteiro
Consuma o meu vazio
Cubra-me com tua pele.

domingo, 3 de janeiro de 2010


Sou como um rio que não percorre seus caminhos
A última gota de orvalho que cai na manhã
O vapor que se esvai antes da última nota ao fim do show
A frieza da lâmina que corta a tensão
O sangue seco que envelhece sem se ver
A frágil face do desespero
A carne flácida antes do parto
Aquele que brilha intensamente antes de pôr-se
O que se opõem ao infinito circular
O que brota no fecundo segundo ao amor.

Trac, tumtumtum,trac, tumtumtum,trac, tumtumtum.trac,
Trac, tumtumtum,trac, tumtumtum,trac, tumtumtum.trac,
Trac, tumtumtum,trac, tumtumtum,trac, tumtumtum.trac,
Trac, tumtumtum,trac, tumtumtum,trac, tumtumtumumumumumumumumum...
BLÉING.
Violei-te meu amor,
violei-te com a palavra solidão.

Só resta o espaço do vácuo
E a caneta sobre o papel úmido
O som da tarde gris
Ecoa por entre ondas
Faz-se gigante o dia
Não se preenche com horas
São séculos intermináveis passando
Não há reflexo caído nos cinzas
O chão não cabe nos meus pés
A claridade enevoante atrapalha
Tudo jaz, tudo se ausenta,
Tudo se acumula ao lado do cais.