quarta-feira, 24 de março de 2010


Quando você olha nos meus olhos
só refletem suas desculpas
não gira o mundo mais em azul.
Não é mais necessário correr
não vou mais te seguir por ai
como em tantos anos atrás.
Guarde suas mãos nos bolsos
hoje eles estão mais macios
e quentes do que eu.
Não traga palavras em buquê
as rosas murcharam
antes mesmo de serem cortadas.
Só lhe peço um favor
guarde os trovões que colhestes
estes podem te iluminar.

domingo, 21 de março de 2010


A estrada bifurcada
sem setas, sem direção
não leva a lugar algum
não traz nada de novo
só poeria e sol caminham.
Somente uma jornada
uma escolha de dados
um andar de curupira
a sorte do acaso.

quinta-feira, 18 de março de 2010


O que seria o amor sem você?
Seria só uma palavra vaga,
vazia e desolada de cor.
Seria só um sentimento furtivo,
uma pequena febre,
uma gravata sem nó.
Seria o ano sem outono,
os relógios sem ponteiros,
as flores sem o sol.
Seria cobrir meu rosto de cinzas,
minhas mãos de terra
e meus olhos com lágrimas.
Seria só um sonho
sem imagem e som.

segunda-feira, 15 de março de 2010


Daqui está tudo tão distante
distancia de cartão postal
vejo o vento batendo em mim
se desfazendo assim
em pequenas contas
sangrando o próprio ar
minha pele muda
não manifesta um ai
recolho o que me sobra
e parto descalço
levando somente
aquilo que já está em paz.

sexta-feira, 12 de março de 2010


Meu jardim,

a partir de hoje,

estará sempre em flor

mesmo que nasçam

flores de plástico.

Risquei as paredes do meu quarto
desenhos tolos surgiram
reflexo do que sinto por ti
tradução de vãos pensamentos
que afloraram do crayon gasto
de reluzentes cores mil
que se finaliza em sépia.
Borrão que se converte
formando frases guturais
saem da parede mofada
atravessando os cantos
repousando na lava quente
da minha garganta.
Vira espada e fere
mesmo sem querer
mesmo sem ser desembainhada
sem corte ou ponta.
E agora não adianta mais tinta
o branco não voltará
temos de nos acostumar
o sangue seca
e estará sempre em ti.

Tudo foi cinzas

tudo ficou na água

levado pela corrente

disperso, caído, rajado.

Calou-se o sol

no poente ao longe

calou-se muito mais

quando meu coração

secou as lágrimas.

Terra vermelha recobre

a pontada seca

na pele tremula.

Agora é novo tempo

hora de mudar

a paisagem de montanhas.

Sorrir banguelo
e ter as mãos cortadas.

quinta-feira, 11 de março de 2010


A língua queima o ar

vocifera gentilezas

erosivas e maculadas.

A palavra solta

sem gesto, sem peso

sem uma marca,

Vazia ela não anda

não gargalha

não dá em nada.

Absorve éter vermelho

mas não resolve,

continua estática,

Fica sem servir,

sem ser adjetivo

ou mesmo

flor cálida.

quarta-feira, 10 de março de 2010


Faz-se luz assim tão calma
em minh'alma serenada
abraça estrela tão aberta
vaso em flor na sepultura
peixes na correnteza
estufas de bolor e musgos
pastos sem ruminações
velas acesas dentro do caixão.
Onde errei então
na vasta imensidão
se o que fiz foi só correr
nos braços de uma paixão.

Voltei agora pra mim
viagem longa
cansativa ao extremo
tudo que levei
apodreceu no meio do caminho
ou deixei que se perdesse.
Voltei com vazio nas mãos
mas de bolsos cheios
porem costurados
surpresas me aguardam
dentro da certeza
de lírios e crisântemos.
Agora é só esperar
nova linha amadurecer
e vestir outras ilusões
de carne e dores.

Hoje acordei com vontade de maça
vago e sem sentido de razão
vesgo pela própria pele
ínfimo pra alcançar as horas
enternecido de inverno
querendo o amanhã
que ele se apresente
longo e rasteiro
e teça nas minhas costas
um véu de acácio
para que eu não engane
a mais ninguém.

sábado, 6 de março de 2010


E o amor aonde foi?
Correu pra debaixo da cama vazia
guardou-se no cristaleira
sumiu do quadro negro
mergulhou na piscina de bolinha.
Tente encontrá-lo
por entre as montanhas da lua
na entre safra do outono
nas luzes do final do ano
em mares de calmaria.
Agarre-o quando o vir
com suas mãos secas
com sua boca gélida
com suas pernas tremulas
com seu coração torto.

Acabou, chegou ao fim
arranquei os espelhos da casa
para que não se reflita,
em mim, sua imagem.
Coloquei um ponto final
no último capítulo que escrevi
sobre nossa fragilidade
de éter opaco.
Demorou mais que o tempo se faz,
mas não existe retorno
nessa odisseia de carne dura.
Aleluia, o anjo caiu
frente ao que restou das sombras
e se esfacelou em mim.
Mas agora que se foi
ainda assim se faz presente
no gosto amargo
dos meus lencóis.

sexta-feira, 5 de março de 2010


Meu mundo gira pra fora
pra fora do espaço
espaço aberto, invadido
um estranho, um ladrão
uma nuvem no oceano
que eu sinto tocar as ondas
que se formaram na costa
prontas pra me banhar.
Sujeito sem nome
me amarra, me sacode
me pinta de vermelho
me deixa na tomada
confunde meus olhos
atormenta meus sonhos.
Corro, tropeço, levanto
sou jogado para o alto
fico sem direção
meus olhos perdem a razão
não há batimentos velozes
meu coração está explodindo.
Explodiu-se em minhas mãos
mas não se feriu ninguém
era só a dor indo embora
e eu ficando entorpecido
embriagado de vulcão
doce lava extraída de mim
é tão bom poder escutar
o nascer do pôr do sol.

Eu quero ter você em meu gosto
Andar pelas curvas do teu corpo
Reconhecer meu cheiro em seus lençóis
Despir meus olhos frente aos teus
Sorver teus poros com os meus
Jogar ancora em tuas areias
Ser meus braços teu farol
Saciar tua fome embriagante
Recolher teu frio em meus tórax
Murar minha estrada pra ti
Sentir teus pés os meus
Ser eu, o você, o nós.

Nada mais faz sentido
a arte perdeu suas cores
os homens só andam calçados
as frases estão sempre entre parenteses
os sentidos são cibernéticos
o tempo se desencaixou da história.
Tudo está num iceberg
as nuvens, os carros, os dejetos.
E onde eu me encontro nisso?
Onde me cabe no momento?
Será que ainda posso conseguir
me encaixar no desespero dos ponteiros
ou na composição do apocalipse.
Quero queimar sob as neves cinzas
de um vulcão adormecido.
Quero perder minha fala no fundo
de um mar vermelho.
Quero poder sonhar
dentro de uma garrafa.
Quero sentir o vento
que sai de minhas mãos encardidas.

terça-feira, 2 de março de 2010


A confusão se espalha
não há tempo para mentiras
a verdade já não existe.
O ser humano entrou num rodopio
perdeu qualquer ilusão da realidade.
As dúvidas ficaram no ar
a incerteza foi levada pelo mar.
As frases perderam seu ponto final
só as reticências e tremas se salvaram.
É tudo líquido e gasoso no agora
mas ainda corta, racha, fere.
Os dias fogem mais velozes
eu ainda na insistência da contra-mão.


Dou uns passos para o lado
nada se move ao meu redor.
Dou um giro em pleno ar
tudo está estático.
Pulo de um canto ao outro
não escuto nenhuma respiração.
Deito-me e me levanto rapidamente
não tem luzes em lugar algum.
Rodopio intensamente
nenhuma palavra se fez.
Caio como uma pedra no chão
a plateia se levanta em gratidão.