quinta-feira, 31 de dezembro de 2009


A lua no alto da montanha
Ilumina meus pés descalços
Que caminham por vales
De sombras e pó.
O vento enxuga meu rosto,
Torto de medo e solidão.
Minh’alma refletida
Nas pedras, assemelha-se
Aos cacos do velho abajur.
Nas minhas veias
Correm mil criaturas vis,
Mas nenhuma macula
Minha infecta epiderme.
O ranço, o riso e o louco
Despertam antes da aurora
E mata o resto que me resta.

Minhas asas se romperam ao anoitecer.
Céu negro tomou conta de mim.
Nem pela pulsante fresta passou luz.
Tudo virando pó diante meus olhos.
Nem o mar, nem o rio era mais navegável para mim.
E o que me restara?
Somente uma foto opaca em sépia.

Não permita que a tristeza me abandone
ainda preciso da poesia.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009


Pequena caixa de madeira
secção de pinho e carvalho.
Oh! Cruzeiro do Sul
que guia as lendas do meu peito
e guarda o homem
que habita em minha boca.


para Cildo Meireles

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009



Pequeno ponto no canto da sala
a disfarçar o volume da estrela magna
descobre a luz vermelha
que se encontra no peso das coisas
transmuta a essência da água parada
enraíza a luxúria do cetim molhado
apaga o pinho e o cedro da carne magra
e tece a teia da escuridão divina.

Uma parede branca
Não é totalmente branca
Há sempre a marca
De um prego.

Minha língua percorre
Os contornos do seu corpo
E arranca suspiros
E gemidos, ao passar
Suave e languidamente
Por entre as suas coxas.
De seu peito escorre
Tranquilo e doce
O líquido do amor,
Ele desce à procura
Da minha boca,
Encontra-a
Em pleno gozo de luz
E jubilo entardecido.

Estrela nua no canto da boca
lábios quentes de dor e mel
leite seco aponta
na ponta do peito
sorridente de prazer
sussurros de agonia
na pele trêmula
o roçar das coxas
uma nas outras
ansiosas para parar
de arder de paixão
os pelos eriçando-se
ao sentir a aproximação
da respiração
coração gemendo acelerado
findar o gozo
em única mão.

Gritos velados na minha garganta
Nuvens alcalinas frente a meus olhos
Onde estará o ar que preenche meus pulmões?

O que você vê em meus olhos?
O seu reflexo?
Sim, é só isso que tem em meus olhos.
O espelho sem alma,
O frio incômodo que aguça a dor,
As trevas brancas que despertam o querer.

Eu sofro a ação do tempo?
Ou o tempo é que sofre
com minhas ações?

terça-feira, 22 de dezembro de 2009


?
Você já teve uma arma na mão
Sabe o quanto isso pesa
Consegue sentir a dor de apertar o gatilho
Você calcula a força de levanta-la até sua cabeça
Você sente o deslocamento de ar
O cheiro da pólvora embriagando seus pulmões
Seus olhos fechando na última lágrima
A velocidade do corpo rígido
A sombra inebriante a se decompor.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009


EL NIÑO


Foram somente cinco minutos. Não durou mais do que isso. Não houve tempo para ver os tons, sentir os cheiros, tocar a umidade. Não sobrou tempo para o nada. Aconteceu às treze horas e cinqüenta e quatro minutos e zero segundos. Havia no ar um quê de claridade, uma claridade nublada de futuro, uma claridade de lua. Por entre pernas o quarto se iluminou, mas a alegria que se ouvia era angustiante, de uma delicadeza de cristal. Estava presa por um fio longo e fino. Passaram-se cinco minutos e o sol já cansado mergulhou no horizonte. A alegria dissipou-se em dor de espinhos feridos. Cinco longos minutos, o tempo de toda uma vida. Não foi capaz de deixar saudade, só a boca seca e uma pequena história.

Dois opostos
Duas atrações
Duas razões
Nenhuma história.

domingo, 20 de dezembro de 2009


Te vejo pelo meu copo ainda cheio
seu rosto se dissolve entre o gelo
minhas mãos tentam em vão te cercar
você se foi no último gole.

sábado, 19 de dezembro de 2009



E eu, ao final da minha vida começo a comer repolho, por quê repolho? Por que não aspargos? É mais fácil comer aspargos, mas me decidi por repolhos. Repolho, repolho, é repugnante comer repolho. Eu deveria comer abacates. É isso, comerei abacates, entretanto comerei repolho e abacates na sobremesa. Não! Por que insisto em comer repolho? Comerei repolho, mas não o repolho como repolho. Comerei o repolho como se come gente. Com asco, porém, comerei. Não repetirei repolho, mas se o fizer, repetirei como se comesse aspargos. Deveria mesmo comer aspargos, não o repolho ou salsão. Salsão é parecido com aspargos, mas não é aspargos, é salsão e é salsão mesmo. Por que então comer salsão? Por que comer repolho? Porque comer salsão e repolho? Por que comer? Por que comer indefinidamente repolho ou salsão ou aspargos?


Para Gertrude Stein

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009


Vou-me embora
encontrar meus espelhos,
ver onde o sol nasce,
recolher velhas fotos,
furtar as boas horas,
tirar o pó da cômoda,
abrir as cicatrizes,
mergulhar fundo
em minha matéria.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009


Sou tão velho

que o céu já não me escuta mais
desabotoar meu paletó amassado

cheirando a jasmim.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009



A cada dia simples,

nasce uma manhã de sol

quando seus olhos se abrem.

E este calor, sei que não passará,

enquanto sua imagem estiver lá.

Agora só penso em voltar pra casa,

para os teus braços

que me protegem da dor.

Meus olhos se enchem com os teus,

não consigo olhar em outra direção.

Daqui a pouco estarei seguro em casa,

para ver teu corpo pelo quarto

e despir meu coração em disparos.

Preciso apertar-te e segurar-te forte,

sentir tua respiração percorrendo meus pulmões,

tocar tua mão, secar teu suor,

mas por hora só há uma coisa a fazer,

me espere, logo chegarei em casa.

Um Conceito Sobre O Amor


Não quer meu abraço,
mas sempre procura por meus braços,
um conforto, um calor,
um conceito sobre o amor.
Você insiste em se manter assim,
longe de mim.
Faz de mim o que bem quer
só porque sabe que sou sua, mulher!
Qualquer tom que possa ter,
nunca será o tom que dei a você.
Qualquer beijo que possa roubar,
serão sempre meus lábios a beijar.
Se faz de difícil, me enche de vícios,
me faz tão mal,
mas mesmo assim,
é com você o meu final.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Começar


Começar,

inicializar o além

além de mim,

da minha compreensão,

além da minha razão.

Começar,

algo que terá fim

algo que não terá

começo

pois já nasceu antes.

Começar,

nascer,

renascer,

fenecer.